Carne, Osso http://carneosso.reporterbrasil.org.br Realização: Repórter Brasil Wed, 26 Oct 2011 21:57:03 +0000 pt-BR hourly 1 Menção honrosa http://carneosso.reporterbrasil.org.br/2011/10/26/mencao-honrosa-em-leipzig/ http://carneosso.reporterbrasil.org.br/2011/10/26/mencao-honrosa-em-leipzig/#respond Wed, 26 Oct 2011 18:15:38 +0000 http://carneosso.reporterbrasil.org.br/?p=182 O documentário “Carne, Osso” participou nesta semana da 54a edição do DOK Leipzig, na Alemanha, e recebeu uma menção honrosa da Agência Européia para Segurança e Saúde no Trabalho (EU – OSHA). A produção da Repórter Brasil foi o único título brasileiro presente na seleção do mais antigo festival de documentários do mundo e atualmente um dos maiores da Europa.

“Carne, Osso” fez parte do Programa Internacional do DOK Leipzig e também estava entre os dez filmes indicados para o prémio da EU-OSHA, concorrendo com produções de todo o mundo, com temas que iam da contaminação por agrotóxicos na Índia à rotina de cardiologistas em um hospital polonês.

A menção honrosa foi anunciada pelo porta-voz do júri, o neozelandês Alex Lee, durante a cerimônia de premiação. A EU-OSHA também concedeu um prémio de 8 mil euros para o documentário alemão Work Hard – Play Hard, sobre a formação de jovens executivos e as estratégias contemporâneas de maximização da produtividade nos escritórios das grandes empresas.

O DOK-Leipzig reuniu uma plateia de mais de 38 mil pessoas ao longo de uma semana e, para a edição de 2012, o diretor Claas Danielsen anunciou uma sessão especial com filmes da América Latina.

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CARNE, OSSO http://carneosso.reporterbrasil.org.br/2011/08/05/carne-osso/ Fri, 05 Aug 2011 23:13:09 +0000 http://carneosso.reporterbrasil.org.br/?p=39 O que vale é a precisão do corte, lacerando o osso, rendendo a carne. Na esteira acelerada da produção em massa, certeira é a faca: doze talhos exatos e já não resta nada, nem coxa, nem asa, nem peito, nem carcaça. Sob a luz pálida do frigorífico, aos olhos alertas da câmera, a mão enluvada é uma lâmina imparável. Quinze segundos e o novo ciclo se inicia. Por oito horas, junto à esteira, o trabalhador é uma máquina ligeira em prol da produtividade. Não pensa, não lhe deixam pensar. Enquanto esquarteja meticulosamente, não abstrai, não pode se deixar tomar por qualquer ideia insensata. O trabalhador é meros dedos, punhos e braços; a faca, sua extensão afiada.

Não é a carne que é fraca, mas a indústria frigorífica se esmera em despedaçá-la. Eis o segredo de sua produção tão prolífica, orgulho da economia brasileira: perecível é a carne humana, é ela a única matéria descartável. E assim há de ser enquanto o controle for escasso, os auditores insuficientes, as multas inócuas demais para alterar o processo produtivo, para romper esse círculo vicioso. Pelas lentes de “Carne, Osso”, o vício é exposto ao contar as histórias de suas várias vítimas.

Seis da tarde, 750 mil funcionários recolhem seus corpos e voltam para casa. Tateiam a pele em reconhecimento incerto: cotovelo, pescoço, costas. A dor se alastra por toda parte, a turvar-lhes o julgamento, a asseverar-se em transtornos psíquicos, em doenças neurológicas. Há um que não poderá voltar, porque o braço lhe falta. Outra dorme com o punho amarrado, na posição que mais a alivie. Uma terceira sente que a mão se fecha e não quer mais abrir, o ombro a repuxar seus nervos atrofiados. Funcionária-modelo, no dia seguinte ela voltará ao trabalho, dez anos sem nenhuma ausência.

Enquanto não se detiver o movimento contínuo da esteira, enquanto não se romper esse ciclo, alguém irá querer esgarçar os dedos dela e entre eles encaixar, ainda uma vez, a faca certeira.

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